O tempo é uma rua de Paris
cheia de pacíficos murmúrios
e rumores de serpente persa
prateado dos vândalos gozos das alamedas
das usinas de absinto estrelado atiçado
com uivos verdes de anis
e tédio cintilante como um parto
ou magnólia de Matisse
perdido entre sementes surreais
de tâmaras setecentistas (centesimais)
rua brotando do sopro de uma flauta surrealista
talhada de uma vértebra sublevada de Breton.
Rua, latada, vereda ou horta música e mística
sons de ossos dadaístas
acantonados na Suiça é o tempo semovente.
As vértebras francesas do tempo aguentam
-sem trema, tremor ou temor (escandinavo)
chusma de espaços cósmicos
fuzilando a rótula da hora.
O tempo além da tâmara
(depois da lis da comuna)
pós-napoleônico e rebelado
vem num junco chinês
(padiola, élitro, mácula, palanquim ou cupê)
pende de uma clavícula de Maiakovski
semelha víscera de Aragon (ou tristeza de Elza)
metade vermelha do coração de Nazim
alado fêmur de Eluard
(com quem a liberdade das horas parece-se).
É uma bandeira que tremula
(tarantela russa, balé de Rasputin)
fincada no abdome de um general qualquer
(servil ao capital que aquartela ditaduras)
como roupa no mais vil varal
expostas a ventos do vilarejo
que Deus esqueceu em Portugal
dos cafundós dos Judas vem ruído de notícias (fundas).
É uma balconista boujando (o tempo)
perto de uma sarjeta industrial
(o gas metano da usura alimentando alvoradas de vacas
pálidas como a injúria ou o descompasso
ou peidando como um embaraço).
Ou uma paisagem milimétrica de Funchal (goleadora)
o microcosmo cônico do Curral das Monjas.
Tempo é dinheiro, pragueja o banqueiro
e não se deve perdê-lo com poesia
tempo industrial, cívico, palpável
(sobretudo monetário ou cifrado do inventário).
Tempo é uma gleba
arrendada a um estranho numa feira
duma vila que Deus esqueceu no cós.
Tempo vale
a santa usura de cada dia
tempo não é tâmara nem precisa de aleluia beduína.