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Dom, Nov

destaques
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O tempo é uma rua de Paris

cheia de pacíficos murmúrios

e rumores de serpente persa

prateado dos vândalos gozos das alamedas

das usinas de absinto estrelado atiçado

com uivos verdes de anis

e tédio cintilante como um parto

ou magnólia de Matisse

perdido entre sementes surreais

de tâmaras setecentistas (centesimais)

rua brotando do sopro de uma flauta surrealista

talhada de uma vértebra sublevada de Breton.

Rua, latada, vereda ou horta música e mística

sons de ossos dadaístas

acantonados na Suiça é o tempo semovente.

 

As vértebras francesas do tempo aguentam

-sem trema, tremor ou temor (escandinavo)

chusma de espaços cósmicos

fuzilando a rótula da hora.

O tempo além da tâmara

(depois da lis da comuna)

pós-napoleônico e rebelado

vem num junco chinês

(padiola, élitro, mácula, palanquim ou cupê)

pende de uma clavícula de Maiakovski

semelha víscera de Aragon (ou tristeza de Elza)

metade vermelha do coração de Nazim

alado fêmur de Eluard

(com quem a liberdade das horas parece-se).

 

É uma bandeira que tremula

(tarantela russa, balé de Rasputin)

fincada no abdome de um general qualquer

(servil ao capital que aquartela ditaduras)

como roupa no mais vil varal

expostas a ventos do vilarejo

que Deus esqueceu em Portugal

dos cafundós dos Judas vem ruído de notícias (fundas).

É uma balconista boujando (o tempo)

perto de uma sarjeta industrial

(o gas metano da usura alimentando alvoradas de vacas

pálidas como a injúria ou o descompasso

ou peidando como um embaraço).

 

Ou uma paisagem milimétrica de Funchal (goleadora)

o microcosmo cônico do Curral das Monjas.

 

Tempo é dinheiro, pragueja o banqueiro

e não se deve perdê-lo com poesia

 

tempo industrial, cívico, palpável

(sobretudo monetário ou cifrado do inventário).

 

Tempo é uma gleba

arrendada a um estranho numa feira

duma vila que Deus esqueceu no cós.

 

Tempo vale

a santa usura de cada dia

tempo não é tâmara nem precisa de aleluia beduína.

Murilo Gun

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