Sei do sal, do seu lento crepúsculo, brusco alvorecer
dos iluminados dorsos, das hostes alvíssaras, cotonifícios
sei do sal, de suas manhãs brancas e domingos náufragos
dos pântanos onde trafegam sonos
do lodo das alegrias sei
das diatomáceas da lagoa
das catracas, dos sorrisos, esgares, martírios
sei das fontes imortais da noite
da solidão inumerável dos túmulos
do inóspito palpitar da morte
sei do sêmen e seu célere balé esponjoso
sei do sal da dor que embalsama
do sol calcinado, da lua cadavérica
sei do lume da seiva, do hino da culpa
do halo da incerteza, das loas que o vento inventa
sei do exaustivo pranto, do êmbolo agônico, da tua
mão em meu peito doloroso
do ditame de teus dedos longos
sei da cela dos suplícios, dos cilícios
que a volúpia intenta
da alma das gazelas
do balir das ovelhas
da certeza das estrelas
ser do pão ímpio pão
do pomar da sombra que ao ventre do fruto incinera
ser do omoplata dos hipopótamos
da lástima dos hititas
e dos salgueiros que chorão por Sião
sei sobretudo de teus olhos e seus longes azuis
sei das tardes em que desnudo me amavas completamente
e sei da ênfase de tuas loucas ancas delicadas
dos suspiros furiosos do teu gemer profano
e sei da serenidade que se apossava de ti após o gozo
(dos montes que Vênus a boca do poeta aviava)
sei das aréolas escuras e do púbis delicioso
de profundos unguentos acoimado
do céu que era meu corpo em comunhão com o teu
dos orgasmos caudalosos aquietados
dos delírios interiores, do sono crescendo como falo jovem
e sei de teu corpo noturno esclarecendo o mundo
iluminando escuros da alma perdida
tonta, desamparada, ímpia (do poeta), sei.
João Pessoa, 01.01.2000
(Criado nos primeiros ébrios
do Novo Ano iluminado
dos sais do alvorecer paraibano).
Quem sabe, o primeiro poema do ano novo
o último do vasto (e bélico) milênio?






