03
Dom, Ago

destaques
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Apodrecem as rosas e os ditirambos

Nas vias opressas as petúnias são atropeladas.

Os cravos se acasalam nas lapelas

Recentes dos defuntos e mordem

Suas faces frias como mármores.

O balsamo louco gargalha, as calêndulas

Comem os alfarrábios.

Magnólias desatinas se suicidam

Em plena praça no crivo

Das ruas côncavas.

As hortênsias violentam os emolumentos.

O baldo devora o nimbo.

Violeta é morta

Os nardos envenenam o duodeno

Jacintos vociferam nos conventos.

Nas longas madrugadas medram as bruscas flores da insônia.

Constelações de cactos apunhalam

O solitário hall dos edifícios

E coroam com tulipas de neon

Os sulcos sonâmbulos da taça.

Fedem as begônias.

O hímen da angélica agride

Os talos da árvore urbana.

Florescem as açucenas da cólera

No interstícios da náusea.

Nos jardins públicos pululam

Pirilampos mecânicos

Sem lume ou alma.

Nos céus da cidade voejam

Borboletas automáticas

Sem cor ou graça

E no peito da avenida vicejam

Andorinhas sem ventre.

Aves de metal bicam os olhos

Dos casulos de aço mudo.

Choram

Os abetos decapitados.

As orquídeas vomitam

O ouro dos vasos.

Acácias bêbadas atropelam

O peito dos magnatas.

As dálias de Baudelaire tombam

Nos becos amarelados.

Madressilvas sangram no olfato.

Jardins são decepados

Com a foice dos semáforos.

Agonizam artemísias

Nos canteiros centenários.

Avencas gritam

Nas varandas fatigadas.

Riem os cravos brancos

Na soleira dos velórios.

As coroas mortuárias se instalam

No rosto dos mortos importantes

E se locupletam de sua boca fria.

As papoulas opinam

Sobre os eneágonos do fumo

E denunciam a jade das hecatombes.

Nenúfares se acantonam

No amanhecer do sangue.

A dor esfaqueia os miosótis.

Na hera prospera a morte.

As grinaldas berram.

Selas de espinhos fendem

O coração dos nubentes.

Nas celas sem lua

As perpétuas sonham

Com utopias roxas.

Os lírios bebem escorpiões.

As samambaias famintas

Devoram as tarântulas do jasmim.

Rouxinóis imóveis fendem o silêncio

Das tundras metropolitanas.

Inóspitos sargaços nadam no logro

E se afogam no ódio das gardênias urbanas.

As lentas luzes das pétalas

Enlouquecem os girassóis

O pólen da cada hora emigra

Nos lívidos jardins da urbe

Para longe dos homens.

Murilo Gun

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