A Marcus Accioly
Eu escrevo poesia porque vou morrer.
Porque a eternidade existe para a pedra
não para a carne
porque o espírito é de barro
eu escrevo para que não mais amanheça
para que meu rosto termine
e o olhar escureça antes do pássaro nascente
escrevo para que flores tombem na tarde
escrevo para que minhas veias gritem
e as omoplatas derruam-se sob pesares
sob fardos de medo do mundo eu ceda
eu escrevo para que mortos se amontoem
em meu ombro escuro em minha face esquerda
nos poços cavos de minha consciência nua
em meu leito abstrato e convulso
nos lençóis úmidos de esperma anônimo
escrevo para reviver espúrios amores
para derrota da noite e triunfo da morte
para gaúdio de madrugadas feridas
escrevo porque vou morrer
e preciso deixar um poema no mundo.