A poesia não é pele. É alma.
Não é para brincar ou parecer. É para ser.
Não é diversão, sorriso da sociedade, império de romantismo pessoal, feudo de emoção, ocupação de ócio, desleixo, devoção ao útil.
Desde Baudelaire, a poesia reenraizou-se na existência, lançou elos na alma, deixou de ser fita.
Se brota da existência humana é impura por natureza, de poluta origem, nada divina. A poesia.O poema é filtro da literatura. Tudo o que seja poético (ainda não é humano no sentido banal ou comercial de o ser) não é literatura. Que é o resto. Todo.
Dons do demônio após Dante os do poeta. Dante e Rimbaud glorificaram o inferno.
A poesia vai além do fato (Valéry dizia os acontecimentos me aborrecem como poeta) busca o fato que seja vero e puro. A ação vira poesia pura.
A poesia é a prosódia da alma. A poesia é uma revolução do si, utopia sem porta.Ela transmuta a realidade e investe contra a resistência prosaica. Contra o mundo da usura e do conforto do corpo. Para que alma, se tenho dólar?
Um poeta amigo meu de Garanhuns (Osman de Holanda Cavalcanti) quando se depara com uma alta despesa perora: “meu nome é dólar”.
A poesia transcende a práxis, isto é, está além de qualquer ação prática, banal ou de mera sobrevivência física.
Conforme Heidegger, poesiaé (a) essência. Em tempos de decadência, a poesia é uma jangada (como a de Ulisses). Em tempos escuros, é uma lâmpada, fagulha (de fátuo marinheiro), faísca, olhar da página. Não gesto teclado. A fraseologia vigente e mutante, o modismo desenfreado,
cívico e passageiro (como tal), algum pudor, todo trauma, qualquer acontecimento, vital ou não, não serve à poesia, não merece poema. O sentimento, diz VCA, é inútil (em poesia). É como perorava Baudelaire: “não confundir tinta com virtude”. Expresse a culpa de ser mas não largue seu ego ignóbil na página (peroraria eu).
Uma aristocracia literária o poeta (poeta) conforma. O poeta deve ser testemunha da transcendência que envolve e rosna no espírito buscando ser.
Todo o estabelecido, todo o continuísmo, todo o constituído, todo o institucionalizado, poeta dissolve para criar o mundo humano. Dante já o fez. Camões também. Perse, Gide, Camus, Joyce, Pound, Eliot, Jorge Guillén,
Aleixandre, Séferis, S. Quasímodo, CDA, Murilo Mendes, Jorge de Lima e Cabral já o fizeram (sua parte)... E nós (que com tanto garbo (falso), orgulho, soberba sonética, sapiência de rima) o quê e quando o faremos?
Quando falo assim, 99% dos ocasionais leitores dirão: endoidou (como o avô) e tudo que digo se reveste da plena aparência do absurdo. Assim é a verdade poética.
O risco que corro é o que danifica minha obra sem pejo incessantemente. Por isso desisti de lançar meus livros (SEIS novos publicados em 2012) ou sepultá-los em escuras ou poeiradas prateleiras de livrarias.
Isso soa como um manifesto mas é um anti.
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