Busco na palavra a secura, o inóspito
de mim que vaga como grito arrancado
do esôfago da náusea que habito, entrego-me
à vida ávida do ácido da morte
triunfo do espírito, à silenciosa
peçonha das horas dedico o sopro último
e esse ofídico silêncio
que me lacra a alma, cofre
de mistérios lentos e turvos, que me
envenenam o derradeiro lábio
de um beijo frio e montanhoso
ao instante cru, à última hora desesperada
dedico ao corpo esta palavra
que nele instila candura áspera
e a dura certeza de inexistir.
Estes poemas imprevistos
são como silêncios insanos ou gritos
arrancados da garganta do livro
(para o ralo anônimo onde a vida drena
decepções, discursos lúdicos, mármores do espírito)
e expostos ao abandono de um dia sem viço
enterrados com meu túmulo
(e o cacto do silêncio que me coube da lida
ofegante e gananciosa da vida inútil estrada)
com minhas veias, meus indícios
e falsos ouros que o outono oferece
como consolação ou holocausto civil.
Saio da vida como quem recolhe uma vela
fecha uma última janela, asila o sol da veia
ou contempla o sal que restou
do mar ínvio, canhestro do sopro
agora sonegado e desdatado para sempre
(sopro antes tão vivo e comemorado
em haustos de gritos e conhaques de aplauso
tão libidinosamente urdido e alimentado
por novena de meses, resmas de cuidados).
(Sopro agora monturo, posta
de sangue e cinza
entre flores deliquescendo
encerrado num túmulo provisório
mas real, túmulo
que as horas depauperarão
com precisão apocalíptica
e crotálica doçura).
Do túmulo extremo e duro, pedra
que trancafia o sopro, urna áspera e pura
tão inesperada mas incerta fúria
lapido este poema insincero mas honesto.
Assisto (a palavra amara em riste)
o espetáculo do crepúsculo
da alma fechado em silêncio acúleo
papoula e absoluto
que é a morte do corpo
e vento esquizofrênico para o espírito
(que triunfa inutilmente
entre décadas e compêndios
de filosofia fria).
Estas palavras sem ventre
ou sentido humano recolho
do vento selvagem da vida
capto do vendaval do espírito
e das emboscadas do destino
e as deito no leito espúrio
dessas páginas tristes
sem desespero ou esperança.
{jcomments on}