Prece açoita orelha
boca acoita reza.
Noite não tem sentido
macula a voz com jorros
de tristezas litúrgicas
amacia almas torrenciais
com sumos musicais ilude o fim
(suspende a seiva viva do início
e tudo o que escape do mim).
Cristo de cânhamo entre rosas floresce
sob guarda de juncos amorosos
e doa grinaldas de Sua dor ao mundo.
Despe-se das chamas e dos cravos e oferece
linho de Seu sangue aos amantes.
Sete sílabas de sal
nove ladaínhas noturnas
treze vândalos ângulos
e uma geometria azul.
A beira do abismo é pura
inteira, quase perfeita, acinzentada
cilindros breves repousam
em seu lábio esquerdo escuro
a vala do esquecimento é dura
pois o abismo é mais profundo
que a alma, mais longo
que a vã desmemória.
Estou dentro da sombra junto à beira
noturna do abismo
e a descrevo sem amparo do sol.
A verdade poética é a que se encarna
numa significação flutuante.
Nada detém a poesia
nem estrofes certinhas
nem o maquiavélico cálculo da palavra.
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