Apodrecem as rosas e os ditirambos
Nas vias opressas as petúnias são atropeladas.
Os cravos se acasalam nas lapelas
Recentes dos defuntos e mordem
Suas faces frias como mármores.
O balsamo louco gargalha, as calêndulas
Comem os alfarrábios.
Magnólias desatinas se suicidam
Em plena praça no crivo
Das ruas côncavas.
As hortênsias violentam os emolumentos.
O baldo devora o nimbo.
Violeta é morta
Os nardos envenenam o duodeno
Jacintos vociferam nos conventos.
Nas longas madrugadas medram as bruscas flores da insônia.
Constelações de cactos apunhalam
O solitário hall dos edifícios
E coroam com tulipas de neon
Os sulcos sonâmbulos da taça.
Fedem as begônias.
O hímen da angélica agride
Os talos da árvore urbana.
Florescem as açucenas da cólera
No interstícios da náusea.
Nos jardins públicos pululam
Pirilampos mecânicos
Sem lume ou alma.
Nos céus da cidade voejam
Borboletas automáticas
Sem cor ou graça
E no peito da avenida vicejam
Andorinhas sem ventre.
Aves de metal bicam os olhos
Dos casulos de aço mudo.
Choram
Os abetos decapitados.
As orquídeas vomitam
O ouro dos vasos.
Acácias bêbadas atropelam
O peito dos magnatas.
As dálias de Baudelaire tombam
Nos becos amarelados.
Madressilvas sangram no olfato.
Jardins são decepados
Com a foice dos semáforos.
Agonizam artemísias
Nos canteiros centenários.
Avencas gritam
Nas varandas fatigadas.
Riem os cravos brancos
Na soleira dos velórios.
As coroas mortuárias se instalam
No rosto dos mortos importantes
E se locupletam de sua boca fria.
As papoulas opinam
Sobre os eneágonos do fumo
E denunciam a jade das hecatombes.
Nenúfares se acantonam
No amanhecer do sangue.
A dor esfaqueia os miosótis.
Na hera prospera a morte.
As grinaldas berram.
Selas de espinhos fendem
O coração dos nubentes.
Nas celas sem lua
As perpétuas sonham
Com utopias roxas.
Os lírios bebem escorpiões.
As samambaias famintas
Devoram as tarântulas do jasmim.
Rouxinóis imóveis fendem o silêncio
Das tundras metropolitanas.
Inóspitos sargaços nadam no logro
E se afogam no ódio das gardênias urbanas.
As lentas luzes das pétalas
Enlouquecem os girassóis
O pólen da cada hora emigra
Nos lívidos jardins da urbe
Para longe dos homens.