02
Sáb, Ago

destaques
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à celeste dissonância da palavra 

Forças passionais urdem na página

o debacle da alma, expõem

ao mundo o nervo da vida ferido

pelo torvelinho da paixão

a arder como um vulcão do corpo

 

ciente da inutilidade do traço

da inanidade da tinta a pena

dolorosamente desiste mas entrega

à alma do papel seu instinto e destino

 

sabe que sempre vence

sentimento de injustiça

 

oferece em holocausto

à perda da potência interior

palavra trêmula

a bailar no papel

esse intacto abismo branco

como folha do outono

tangida ao acaso de um vento vagabundo

  

toda dissonância do espírito

se funde com simetrias severas

em vorazes máscaras encontra

simulacro ideal para

melhor soar sua dissidência

 

desmesura abre suas asas

voa sobre abismo consciente do céu

treva unida à alma

corpo e vento de mãos dadas

aragem da morte (sopro inverso)

ou da praça descrita da carne

a espadanar folhas do ocaso outonado

para casta árida de um canto

qualquer da vida dissipada

seca como cacto abandonado

 

até que informes gritos

de um deus despedaçado

lastreiem céus

perambulem nos olhos

do poeta cansados

da brancura infalível da página

(que resiste a seus falsos intentos poéticos)

 

até que lucidez emirja

do poço frio da vida

para centro da náusea

 

até que lucidez

inflexível e fria

desista da jornada e use

como lápide branca

oca página onde

poema rasteje

incompreendido falso.

 

 

 

Murilo Gun

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