A linguagem é seu próprio passado. Os sentidos de um texto (fala, palavra) constituem-se pelo seu uso, são sua própria história.
Segundo G. Steiner, à diferença da linguagem, nenhum uso anterior (no tempo, histórico) pode associar a nenhuma cor ou som musical um significado específico. Não cria uma estirpe os materiais da música ou das artes plásticas. Não ficam, no universo do som ou da cor, um traço, uma marca, uma história, que o uso incruste, assinale. As palavras significam. É seu papel único. E o significado não pode ser unívoco (a não ser que este seja rebatido com a marreta do hipérbato). O significado não é uma pele, é a alma da palavra. São sucessivos revestimentos, lacerações de sentido, reapropriações, camadas e mais camadas de vida filológica que as impregnam.
Uma só palavra (um só significante) recebeu tantas cargas de significado, registrados ou não, que é impossível avaliar essa avalanche de dados (e ditos) que a recobre sempre.
A história de uma palavra é rica, cheia de altos e baixos, peripécias filosóficas, pressões da fala, torneiros de escribas, em suma, um volume virtualmente incomensurável de precedentes pressentidos, traços de uso, fragilidades das reiterações, desenhos da imaginação, sinais dos tempos nela ancorados, traços que as horas nela deixaram irrecusavelmente.
É essa viagem, périplo inconcebível da palavra pela vida, pelo mundo e espírito, essa utilização infinita que (sobre) determinam seu sentido.
À poesia, cabe o papel de questionar, resgatar, restaurar, transfigurar essa peregrinação da palavra pelo mundo dos sentidos.
Ao poeta, cabe o papel de atiçar, acicatar, reviver, retratar, refutar, abarcar, estender esse veio, essa pletora, esse universo de sentidos superpostos, repetidos, ressentidos, transformados. Daí, a ambigüidade, os polissignificados, a abertura ao infinito do significado.
A “casa” do sentido de uma palavra, reza o sacerdote-mor da crítica cultural, George Steiner, já está excessivamente mobiliada, num grau muitas vezes sufocante, que quase não cabe mais informações (móveis que constituem uma face do signo).
Com fundamento nessa potência que é palavra atualizada na fala e no poema, na narrativa e na especulação, Heidegger disparou: “Não falamos a linguagem. Ela nos fala”.
O poeta tem experiência de vários momentos ou situações, em que bate, colide, luta com os limites linguagem. E essa busca de sentidos (novos) é a regra(a pugna).
Bem sabemos da angústia, do desastre da impaciência, frustração, agonia, dor, quando as palavras nos faltam, ficam na ponta da língua e não saem desse limbo úmido, desse lugar...