César Leal
“Burocracial, de Vital Corrêa de Araújo é, sem dúvida, um dos melhores livros de poemas publicados no Brasil nos últimos anos. Lançado pelas Edições Pirata, com capa e programação visual de Iran Gama, estes poemas revelam um autor na plena posse da técnica e processos de composição altamente representativo da melhor poesia de nosso tempo”.
“Há na poesia de Vital Corrêa de Araújo algo que vai além do expresso no corpo sonoro da linguagem. Sente-se que há em seus poemas uma lucidez intelectual somente percebida pelos iniciados no material simbólico que se oculta no interior das palavras. É esse material que assegura ao verso o resplendor musical”.
“Na poesia de Vital Corrêa de Araújo a rima é extremamente rara, mas os poemas são ricos em seus efeitos sonoros, uma sonoridade eficaz por estar diretamente relacionada aos signos lingüísticos portadores das cargas semânticas. A orquestração de seus poemas deve-se antes ao hábil domínio que ele possui sobre os “elementos inerentes” dos sons e à inteligente associação que faz dos elementos inerentes com os “elementos relacionais”. É assim que ele consegue retirar do elemento sonoro uma forte carga de significados, como se pode observar em quase todas as passagens como estas do poema “Mesa posta ao Apocalipse”:
“reguem-se, gargalhem
esqueçam-se das úlceras
empunhem cálices
gorjeiem, levitem
lavem suas almas
nas espumas da champanhe
inacabável
afastem enfarte
de juros e injúrias
cultivem ócio
com luxúria e dignidade
e sôfregos bebam paz
na água calma do pote
longe das tempestades”.
“Mas a poesia de Vital Corrêa de Araújo não se limita a uma afirmação, no mero plano das palavras, de seu domínio técnico. Ele ataca a linguagem por dentro, realizando uma forma de desconstrução que representa, como tem observado o crítico canadense Sébastien Joachim, uma autêntica revolução”.
“Vital Corrêa de Araújo é um desses poetas destinados a tornar-se um dos grandes da poesia em Língua Portuguesa”.
(do livro Dimensões Temporais na Poesia da Editora Imago
Publicado no DP em 1988)