03
Dom, Ago

Poemas
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A essa forma de prece e alvorada

a esse continente de sede e sonho

o mais puro brinde ergo

brando o trago mais profundo.

 

 

 

A essa lágrima de cristal e garça

a essa cave em que o vinho golfa

a essa gota aberta em copa

oferto a tua boca minha taça.

 

DIVO  VINO

Aos deuses tintos

habitantes dos céus dos tonéis.

 

 

Nem hecatombes despertam

esses deuses cúbicos

de sua bêbada meditação

no altar das tinas

da longa igreja das adegas.

 

 

DOIS POEMAS VINHOS

O vinho da palavra chama-se metáfora

Sua embriaguês poesia.

 

 

 

Das navegações nos lagares

memórias de âmbares rios guardas

e a paciente fragrância

do cerne de acanto e nascente.

 

 

VINHO

Vinho é um monge

na cela da pipa recluso

cave onde medita e amadura

contemplando madrugadas mornas

cúmplices essências descobrindo

no minucioso silêncio das dornas.

VELHO E BOM VINHO GIDE

 

O vinho da tâmara chama-se lagmy

e foi uma taça de lagmy que um pastor cabida

a Gide ofereceu nos belos jardins de Uardi.

 

Gide bebeu todo o sôfrego vinho

e viu gerar-se vasto oásis em sua íris

da pupila viu brotar o tempo íntimo

o deserto dessedentou-se em sua boca rubra

a tarde apascentou-se em sua mão de lua.

 

Entre flores afegãs e pedras beduínas

Gide navegou

no dorso dos camelos da utopia

nas águas fundas da fantasia

nas ásperas naves

do seu sonho árabe.

 

Gide embriagou-se longamente

com o vinho capturado

no coração das tâmaras profundas.

 

 

Orvalho cálices invade

com gotas de grito redondo

o peso do silêncio estraçalha

taças azuis e copos de cobalto

pólens úmidos esmaga

rudes estames crava

na cruz da pétala

(néctar moribundo prega

No peito da abelha operária).

 

O usado hímen da rosa

logo se acrisola.

O buquê acrílico

torna-se lua ilhada

do quinteto palavra.

 

AO PESO DO CÁLICE

À escura morada, ímpia casa, lar extremo

dos pobres pecadores não entram

preces para os desesperados

nem escapam do subterrâneo refúgio

as súplicas de suas vítimas

e ainda que plutão ouvisse

o acaso dos rogos atravessados

ou o pranto arremessado do peito

do âmbito do Lete suspenso

no oco desse rio esquecido e asqueroso parado

suas surdas ribeiras beberiam os apelos

e lágrimas cairiam nas bacias do vão esquecimento.

PIEDADE INÚTIL

Céu aquoso o exército

do acaso cria

com o estanho da tarde

preso à geografia.

 

A gramática do poente deixou

rastro noturno na veia nascente

ou na voz que o sol levanta

com afasia.

 

Plástica da violência

corda na garganta

eis o dilema.

 

 

ESTAÇÃO TERMINAL

Árido vão do espírito

gota de sangue em visceral

cela de ávido cristal

lágrima em decúbito oftálmico

sal lunar do sertão astral

(de cacto em cacto deambula

em busca do Beugma onda lonjura).

 

O vão da vida é árido

ou o árido da vida é vão?

Adivinhe, proba leitora!

 

 

MULTIPLA ESCOLHA?

 

Silêncio corta a espessura do uivo

de aço, carne, dilúvio.

O dia vendeu o grito

da multidão ilusa, deserta, áspero

(da branca praça exilada).

Sem mácula a tarde foi-se.

Ser elenco da noite. E cúpula

(O afiado gume segou a safra

da voz, estilhaçou a muralha do silêncio).

CORTANTE SILÊNCIO

 

Murilo Gun

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