Como lume e sal olhar sega a pele
retalha sol navalha a fio
manhã seivando ainda o arredor
(de pássaros encaracolados no fio do canto
voo esculpido da alma do barro
ária da veia abrindo sonatas do sangue
sino rural peito de campânulas abrindo
pétalas de som voando entre taças de flor)
velho sortilégio da vida impondo à pedra
privilégio do hino, virgem círio
iluminando hímen, estame acúleo
ótico urdume do meio do amanhecer
imersa bacia onde trêmulo carmim
corrompe íris do meio-dia
selvagens azuis e azeites ermos
(que silêncio açule)
a velhas lágrimas do poema aludem
(enquanto o parto das rosas escoa
pelos caules tristes, pelo cerne vivo
– e cardos da comunhão.
Dois vícios brotando de altares escuros
seivas e lumes pousando no delírio de antúrios
horda de andorinhas descendo sobre o mundo
eternidades vazias flutuando no espaço púbico
que o infinito delimita dentre sucessivos cios
gôndolas dos relógios moles do mundo
a Dali assediando, salas de um tempo mágico
encenando o futuro – e as dores que virão
verbo espúrio aviltado revoltando
a veia do poema pendulando inteira
entre ressurreição do lodo e escombros nus dilema
(que navega entre o que é e o que não foi)
eco que eco cega, cal que uiva, puro muro
florescendo entre palavras (e dentes de sílabas famintas)
que dormem na boca inconsciente dos homens.