02
Sáb, Ago

                      Brisa vai percorrer

                     todos os surdos ângulos do labirinto

                     ébrio eco de medo reverbera

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                                                  Vital Corrêa de Araújo

     É usual, em poesia, utilizar símbolos com o intuito (não a intuição mas o propósito deliberado, racional) de dizer algo referindo-o indiretamente via simbologias.

      Nisso, nesse mecanismo, consistiria a correia de transmissão do sentimento poético ao leitor à espera de receber a carga emotiva, o conteúdo simbólico proposital que a poesia carregasse.

      Mas T.S. Eliot sujou o esquema. Segundo ele, a única maneira de exprimir a emoção (transmitir a comoção, comover o leitor), sob forma de poesia – arte da palavra, é não utilizando o símbolo (muito subjetivo), mas o correlativo objetivo, liame que objetivamente unta a vária subjetividade do poema sem miscigenação de emoções ou confronto íntimo.

      Ou seja, o transporte da emoção (poeta/leitor) por meio de palavras (poéticas, imagéticas, etc) dar-se-á via ambiente objetivo (não pessoal ou meramente íntimo), pelo posicionamento ou disponibilidade das palavras, elos dessa cadeia de transmissão dos acontecimentos que o poema contenha. Mas pelas cordas de resistência máxima que imprima ao potencial poético. Fora dessa constelação de condições, dessa cadeia de enlaces verbais, não haverá poesia, isto é, transferência de emoção simbólica ou via simbolismos não funciona (mais).

      Mallarmé, conforme lucidamente observa Charles Chadwick, em A linguagem crítica, dissera algo, semelhante a Eliot, trinta anos antes, em 1891, ao definir o simbolismo.

“como a arte de evocar um objeto (emoção, sentimento, filosofia, sensação espiritual) a pouco e pouco, gradativa e sempre, de modo a revelar um estado de espírito, ou reciprocamente (ao inverso), a arte de partir do objeto (coisa, acontecimento, situação) e dele extrair (revelar) um estado da alma”. Um correlativo e não uma emoção direta.

      O que revela (cria) o estado de espírito é o ato de decifrar o objeto (que não é dado, imediato, direto mas sugestão). Esse ato é “a pouco e pouco”, gradativo, lenta e silenciosamente, de tal modo que haja da parte do leitor desfrutamento, uma fruição, quase um orgasmo decifratório (ou devoração quimérica), que enlargueça, exorcize, resplandeça, imirja esse leitor quase no desvario, e faça assim a poesia delirar.

     Portanto, o que em palavras seja o correlativo objetivo do que o poeta sinta e queira exprimir, compondo o que se nomine poema, não deve ser dado imediatamente, mas velado, apenas esboçado, sugerido, para que ao leitor caiba o trabalho maior, o esforço generoso (rogeriano) de revelar, destrinchar (como bom portenho picanhesco do verbo), decifrar desnudamente e oferecer ao mundo o petisco (duvidoso) da palavra com rumor de alma e sugestão de carne.

      Pois, conforme Mallarmé, nomear, ditar, esclarecer um objeto (ou sentido) é banir (gastar, esbanjar cruamente) a maior parte do prazer que um poema possa suscitar.

      O gozo interrompido do leitor pelo suposto ao dar de graça, entregar o sentido do poema, movido, por uma ânsia (esquizofrênica) de objetividade, excessiva racionalidade, deletando, bloqueando o processo (sutil) de revelação gradual e operoso do poema, é pura malvadeza, pecado contra a órfica arte da poesia, demência, irresponsabilidade de quem supostamente se intitule poeta em vão.

      Ao orgasmo interrupto contraponha-se o gozo ininterrupto do leitor, que verdadeiro poeta propicie.

      Certo teor hermético cria (e nutre) o mistério da poesia.

      O simbolismo, como modo de expressão que não refere algo de vez mas o  faz aos bocados, referindo-o a pouco e pouco, sugerindo-o ao invés de aponta-lo, dizê-lo, em definitivo, foi vital ao salto (dialético porque parnasianismo X simbolismo digladiavam-se) que resultou na modernidade poética do século XX.

      As inovações e técnicas novas da poética simbolista foram fundamentos para a eclosão do verso livre, condição fulcral da poesia moderna.

     Gustave Kalan, que elevou o verso livre à condição de alicerce e baluarte da poesia, foi influenciado pelo simbolismo no seu proselitismo pelo versolibrismo. Foi deste poeta que Eliot intuiu a importância e o valor estratégico do verso livre para possibilitar à poesia a condição de refletir o século 20.

      Mas a fundação da poesia moderna foi suportada pelos ombros atlas da tríade quase diva da poesia da era moderna: Rimbaud, Baudelaire, Mallarmé. E seus discípulos maiores Valéry e Laforgue.

      E Lautréamont, como centro de conexão e indução, como realidade do absoluto, motor do delírio, da palavra convulsa como propulsora da beleza do verbo enlouquecido, que é a poesia.

                                                          Vital Corrêa de Araújo 

Garanhuns é uma cidade mítica.

Atenas nordestina. Elêusis elevada. Cintra das alturas.

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                         Vital Corrêa de Araújo 

     A diferença do modo ocidental de vida da palavra-sempre preparada para amoedar o significado, apropriando-se de sua possível mais valia de sentido e explorando-lhe as usuras como forma de vencer na vida do poema (alimentado pelos lucros imediatos da compreensão), o modo oriental de veia da palavra é tanto mais relaxado quanto mais concentrado.

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Murilo Gun

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